sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Ser significativo...

"Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados" (Carta de S. Paulo, Apóstolo aos Efésios)




Fiquei por alguns momentos observando aquela moça...
Dividíamos o mesmo espaço...um jardim oriental que decorava o quintal de uma clínica.
Eu, ela e algumas abelhas, que cortejavam lindas  rosas emprestando uma beleza ímpar ao local .
O som de uma pequena cascata preenchia o ambiente com sua melodia constante e harmoniosa.
Fluía paz ali, ou quem sabe...em mim.
Não há como não devanear em condições assim, logo eu, que preciso de bem pouco para fazê-lo.
Ah, sim... a moça...
Cabelos lisos, preto, curtos, tipo chanel, camiseta preta sob um colete e bermuda jeans...
Calçava tênis sem meia, clara, de beleza rústica.
Tudo nela indicava fazer parte de algum movimento de contracultura.
Mas foram suas tatuagens que recobriam ambos os  braços, as culpadas por esse devaneio...
No braço direito, um violino...
Pouco abaixo deste, uma maçã, e, dentro dela, o mapa mundi.
No outro braço, três rostos enfileirados do que pareciam ser soldados  de chumbo, fardados em frente a uma fábrica e uma inscrição em inglês que dizia algo como: "somos como robôs...estamos mortos".
Foi aí que percebi, ao olhar pessoas entrando e saindo daquela clínica, o fundamento da crítica que sua pele estampava.

Passei a refletir sobre como ser mais significativo para as pessoas à minha volta...
Como deixar de agir feito um robô programado pelo sistema...
Algumas pessoas terei uma chance só de ver na vida...
Preciso deixar-lhes ao menos meu sorriso, e este, com significado.

Não quero viver correndo para lugar nenhum, sabotando minha necessidade de convivência.
Somos condicionados a sistematicamente desumanizar e coisificar o outro.
Somos como robôs...não vivemos para além do que nos deixamos programar...estamos mortos.
Tem pessoas que são como âncoras para nós...
Nos são referência, porto seguro, ouvidos atentos, voz oportuna...são significativas.
Pessoas que não deveriam morrer, mas que morrem...porém, continuam significando.
Minha morte tem que ser sentida...se não for, significa que passei a vida sem significar.
E isto não quero, viver morto.

Ser significativo é isso...
É ser necessário...é ser presente...
É passar mensagem a desconhecidos, ainda que sem saber...
É ser do seu próprio jeito, ainda que diferente, mas que de uma forma ou de outra, comunica.

Ser significativo é ser lembrado quando a coisa aperta...
É provocar riso mesmo estando ausente...
é fazer saudade quando se parte.
É com um simples bom dia, tornar bom o dia de alguém.
É contribuir para que o mundo seja mais musical e menos pecaminoso.
Enfim...
É ser como Jesus foi e nos ensinou a ser.


Marcelo de Paula



Para minha aluna , amiga e poeta Kelly Santos

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Medo da dor...

"...homem de dores e que sabe o que é padecer." (Profecia de Isaías - cap. 53)


Confesso que tenho medo da dor...

Não da dor do corpo, mas da dor que dói na alma.

Aquela que grita em silêncio...Grito que ecoa no vazio da indiferença de um mundo por demais ocupado.

Aquela que não encontra consolo, por este já não existir...

...que se reproduz no tempo que não passa...

...que te judia  ao cair da noite fria quando a lua sorri tímida entre estrelas quase opacas.

Aquela que te convida à valsa fúnebre do absurdo, e te conduz feito aprendiz do sofrimento.

Aquela que te rouba o chão e te faz sentir ninguém.

Aquela que sente o rejeitado...

...o que ama em segredo...

...o que dorme ao relento...

...o que esperava o mínimo e não teve nada...

Aquela que sente o injustiçado...

...o que desconhece a razão de tanta desventura...

...o preterido no banquete da felicidade...

...o que almeja o fim, por não ter tido sequer começo...

Ficaria horas devaneando sobre as possibilidades da dor.
Longe de ser um auto flagelo, é um exercício de humanidade...
O medo da dor não me inibe de refletir sobre ela.
Sei que pessoas sofrem ao redor da terra.
Não me permitirei anestesiar pela indiferença.
Quero dividir meus medos para que os que sentem o mesmo saibam não estar só, pois, das piores dores da alma, é aquela que a gente sofre sozinho.
O que costuma me acalentar nessas horas é conhecer um homem muito especial, conhecer por experiência, de andar com ele...
O profeta o chamou de "homem de dores e que sabe o que é padecer".
Ele também se viu só...
Do alto de uma cruz viu o céu enegrecer e a chuva desabar...
Viu sua mãe chorando em prantos sem poder lhe consolar.
Viu no olhar de seus discípulos o pavor do desencanto.
Por passar por tudo isso, Ele sabe te compreender...
Mas confesso que ainda tenho medo da dor, assim como você...até um dia...
...tudo isso passar.

Marcelo de Paula


Dentre as muitas dores, uma das mais recorrentes são as de amores mal sucedidos...
Divido com vocês "O que mais dói" dos rapazes do Rascal Flatts...





sábado, 17 de novembro de 2012

Eu, igual...

"Por isso me abomino e me arrependo no pó e na cinza" (Livro de Jó 42:6)





Eu, igual...
Igual a você...
...e quantos mais?

Pensavas ser o único habitante do vale do silêncio?
Aquele lugar onde os rios são de lágrimas e as estradas não levam a lugar algum...
Onde a noite chega depressa, mas custa...como custa amanhecer.
Castelo de sonhos abortados...parque de depressão...
Colo de mãe triste cuja semente não vingou.
Canto em que o canto desafina com o desencanto dos desencontros.
Lugar sombrio...interior de nós, vós...eles.

Mas quem se importa?

Eu me importo...

Eu, igual...
Igual a você...
...e quantos mais?

Quando as dores se encontram ficam menos dolorosas...
e o cuidar da chaga alheia nos faz sentir mais fortes.
Ah, este mundo de aparências, onde a felicidade nos é servida em pílulas de placebo...
Acreditamos no que nos convém diante da ausência de certezas.
Não, não quero parecer herói, muito menos sóbrio...
Não quero ser a voz que aponta o caminho...
Antes, quero caminhar com os que perderam a voz.


Eu, igual...
Igual a você...
...e quantos mais?

Se somos iguais, demo-nos as mãos...
Façamos companhia à solidão uns dos outros.
Dispensemos o orgulho torpe que nos distancia.
Vivenciemos plenamente a experiencia de sermos humanos.
Livremo-nos das máscaras que não nos permitem reconhecer no outro.
Admitamos nossas contradições e nossa fome de verdade.
Perdemos o aconchego do Paraíso ao adentrarmos o portal da insensatez...
Crucificamos a nossa paz ao escolhermos Barrabás...

A terra prometida nos aguarda, no entanto...
Lá os rios são de água, água pura e cristalina, e O Caminho leva à vida...
O sol brilha constante, ilumina e aquece nossas penumbras...
Colo de mãe satisfeita com o filho alimentado...
Canto de anjos, miríades deles, que cantam encantados pelo reencontro de Pai e filho.
Lugar de Paz...interior de quem quer que aceite o projeto restaurador de Deus.
Nascemos para viver, e viver intensamente...


Eu, igual...
Igual a você...
...e quantos mais?


Marcelo de Paula


Para Carine Gama e todos os  que, como nós, enxergam o invisível.



quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Desesperança...

"Para quem iremos, Senhor, se só tu tens palavras de vida eterna"?
(Evangelho de S.João, Apóstolo, 6:68)




Para quem iremos?

Pior que a falta de esperança é a desesperança.

Não, não é mero jogo de palavras...nem mesmo um simples devaneio, é uma constatação.

Falta de esperança é a "não esperança"...aquela que nem chegou a existir.

Desesperança, por sua vez,  é a esperança que deixou de esperar...

É a esperança que, cansada, desesperançou...

que desistiu...

Esperança que morre, pense comigo,  nunca foi esperança.

Esperança vai além do sentimento...não é suscetível à inconstância de nossos humores.

A esperança é multiplicadora...

Que seria daqueles que se inspiram em nossa esperança vendo-a desesperançar?

Não quero nem imaginar.

Temos mil razões para cansar, é verdade,  mas...um milhão delas para se recompor.

Temos referências, temos para onde olhar...

Temos porque esperar e, mais que isso, por quem esperar...

"I have a dream today"

Que seria dos negros em todo o mundo não fossem a esperança de Martin Luther King e também de Mandela?

Que seria de tantos miseráveis na Índia não fosse Madre Teresa, que, diga-se de passagem, quase desesperançou...

Seria a Índia independente não houvesse Mahatma Gandhi?

Seriam oitenta mil crianças libertadas do trabalho infantil nesse mesmo país, não fosse pelo desprendimento e compromisso do ativista Kailash Satyarthi?

Sinto-me pequeno demais diante destes seres humanos...

Sinto-me pesado na terra.

Devaneio...

Eles não se permitiram desesperançar diante da escassez de esperança.

Eles atravessaram sua "noite escura da alma" fitando os olhos sobre o que a grande maioria de nós ignoramos.

Esperança que permanece é verdadeiramente esperança.

Oh, esperança que emana da cruz... esperança vertida em gotas de sangue puro sobre terra desolada..

Cordeiro de Deus, imolado na desesperança dos loucos que se fazem deuses...

Sobre ti repouso minha fé...sobre ti, que reina e vive para sempre.

Sim, Jesus de Nazaré...

Tu és minha única esperança.


Marcelo de Paula



Para minha grande amiga Marcia Fernandes



terça-feira, 6 de novembro de 2012

Quando aperta o peito...

"As ânsias do meu coração se têm multiplicado; tira-me dos meus apertos" (Salmos 27:17)




Abro o mês de Novembro falando de aperto, aperto no peito.

É de vez em quando que acontece..

A sensação não é nada boa...

O ar fica pesado, a boca meio que seca e a tristeza lentamente se instala.

O medo, então, se nos impõe...a paz já nos deixou.

Sentimento de impotência, torpor...sei lá...

A angústia não tem hora pra chegar...ela simplesmente chega.

Ainda bem que passa...

Faz tempo que não ocorre comigo, não advindo de causas interiores, pelo menos, porque a bem da verdade, meu peito sempre aperta diante do sofrimento alheio.

Não quero mudar, essa empatia me faz bem...me humaniza retardando em mim os queixumes da velhice.

Mas li na página de alguém:

"Hoje meu peito está apertado"...

Aquilo tocou-me...

Tocou-me porque conheço bem a melancolia dos sinos que se tocam ao cair da tarde.

A melodia fúnebre que ecoa nos porões da existência incerta, que, mesmo acompanhada, se sente só.

A beleza que não convencida da sinceridade do espelho, espera em vão o elogio de quem lhe tiraria toda dúvida.

Enfim, conheço a angústia de ser invisível quando mais precisava ser visto.

É claro que o peito aperta...

Mas qual laço de amor jogado do céu, eis o socorro providente que me impede de sufocar no desalento.

A palavra amiga, a frase  relida, a boa notícia, o humor gentil...

São tantas as formas com que Deus me faz perceber que no peito em que bate um coração contrito, ali Ele também faz a sua morada.

É claro que o peito expande...

A melodia agora é a da sinfonia dos anjos que Ele elege para me cuidar.

A luz invade cada canto secreto e clareia segredos inconfessáveis...

As janelas da alma se abrem e ventilam o doce sopro do Espírito.

Em Deus encontramos aceitação.

Por meio de Cristo , que de peito aberto nos atraiu à cruz para fazer de nós homens e mulheres felizes...

...em qualquer circunstância...em qualquer momento, pois...

Tua Graça nos basta.


Marcelo de Paula




Á minha amiga Alessandra Ribeiro